domingo, 26 de junho de 2011

#6

De repente ele a viu. E por um átimo de instante nem sequer reconheceu. Aqueles olhos que tantas vezes havia feito brilhar, agora brilhavam sozinhos. Passou, pernas nuas, sorriu, cabelos soltos. A mesma risada de sempre, gesticulando como quem quer abraçar o mundo e nem o vendo parado ali. Falava ou não falava? Procurou se lembrar se havia mesmo tentado enganá-la um dia. Falou. Soou mais como um murmúrio. Estava intimidado. Ela se virou, olhou e então o abraçou com a força de muito tempo. Ficou apavorado. Preferiria tudo. Palavrões, pontapés, murros e até sangue. Mas abraço? Aquilo o desarmou. Continuava a mesma. Certamente com a velha teoria do tudo passa um dia. Deve ter sido assim. Ele deve ter passado. E agora a também velha tática da indiferença. Continuou nas tentativas frustradas de lembrar que diabos acontecera. Só lembrava que errara gravemente. Da sensação ruim. Do peso na boca do estômago. Mas como se nos olhos não havia amargura nenhuma? Ela fez perguntas. E a vida. E a família. E velhos novos sonhos. Ele respondeu. Indignado com a despreocupação e o tamanho charme com que ela o escutava. Demorou, mas ele se lembrou de tudo que ela realmente significara. Engraçado. De repente pareceu confusa. O olhar, que já parecia indiferente se mostrou mais auto-suficiente ainda. Bom, não importa. Na cabeça parecia que mil pensamentos iam se formando. Ele já não queria saber. Na verdade se perguntava porque a havia deixado, então. A única coisa em que pensava era em tê-la de volta. Esqueceriam o ponto final e fariam um recomeço. Havia finalmente se lembrado de quem ela era. Tudo agora faria a diferença. Sorriu, estendeu a mão, mas de resto, não entendeu nada. Boa sorte?


...


Ela como havia planejado o avistou. Virou para o outro lado com as pernas milimetricamente deixadas a mostra. E os longos cabelos soltos propositalmente. Ficou com medo de ter exagerado nos gestos. Deu uma gargalhada, fez que nem o viu. Depois de reconhecê-la, ele se fez de hesitante. Ela quis rir de novo. Estava funcionando. Viu nos olhos dele a dúvida e as tentativas frustradas para se lembrar que diabos acontecera. Era óbvio que não lembrava. Afinal, o mesmo tolo de sempre. Falou algo, como quem tem medo. Sussurrou, na realidade. E com aquela cara de tudo passa um dia, ela fez exatamente o que mais feriria seu orgulho. O abraçou. Com força, mas procurando se concentrar. Caso perdesse o foco, o abraço poderia se tornar um potencial prejuízo para os planos. Mas não se tornou. Ele havia errado. E isso, ela não poderia perdoar. Ou poderia? Sentiu a costumeira sensação ruim, da qual nunca se livrara. O maldito peso na boca do estômago. Engraçado. Parecia estar diminuindo agora. Nos olhos, o véu que ela aprendeu a usar em frente ao olhar. Aquele véu que escondia tudo e não deixava passar nem o amargor que sentira. Ainda sentia? Fez perguntas. Quis saber. E a vida. E a família. E velhos novos sonhos. E ouviu. Com cara de despreocupada, mas não prestando realmente atenção. É Isso. Não queria realmente prestar atenção. Não fazia diferença. É. Não fazia nenhuma diferença. Na realidade, começou a se perguntar o que fazia ali, então. Na cabeça parecia que todos os mil planos iam se desmanchando. Analisou o que é preciso para se notar o desamor. Talvez uma aproximação forçada e idealizada? Talvez. Será? Será que era ali então que finalmente notara esse tal de desamor? Seria esse então o tão necessário ponto final? Não quis mais saber. Afinal, em segundos se lembrou de quem era. Virou as costas, ainda tendo tempo de vê-lo de mãos estendidas e sorrindo, desejou boa sorte. Foi embora.

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